HOME OFFICE –  É necessária regulação?

No dia 06 de outubro de 2020, foi apresentado à mesa Diretora da Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 4831/2020 que acrescenta dispositivos aos artigos 75-C e 75-D da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), estabelecendo diretrizes sobre o trabalho em home office, uma vez que não existe regramento na atual legislação.

O texto traz expresso que (i) a jornada de trabalho home office atenderá as mesmas normas do trabalho presencial, vedada a extrapolação; (ii) a comunicação com o trabalhador poderá ocorrer via quaisquer plataformas, (iii) o uso de programas, aplicativos ou redes sociais de caráter eminentemente privado, sobre assuntos relacionados ao trabalho e em ocasião de intervalo interjornada, será computado como tempo de serviço com garantia de hora-extra; (iv) a responsabilidade é do empregador pela aquisição, manutenção ou fornecimento dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura necessária e adequada à prestação do trabalho remoto; (v) o reembolso de despesas arcadas pelo empregado é de responsabilidade do empregador.

A justificativa do Projeto de Lei é que a adoção, em grande escala, do trabalho em home office em função do isolamento social para conter o novo coronavírus, combinada com o anseio das empresas por maior produtividade, demandou uma carga excessiva de trabalho e tem afetado a saúde mental dos profissionais. Diz ainda que o regramento vai ao encontro das necessidades dos trabalhadores em conciliarem as atividades profissionais com a atenção à família e, ao mesmo tempo, gerenciar o descanso necessário à recomposição física-mental.

A Proposta legislativa ainda insere a previsão de que qualquer alteração que contrarie os artigos 75-C e 75-D deve ser realizada através de Acordo ou Convenção Coletiva de Trabalho, assegurando a participação do Sindicato profissional na defesa e proteção de sua categoria.

O Ministério Público do Trabalho já havia tratado do tema ao emitir, em 10 de setembro de 2020, a Nota Técnica de número 17. Referido documento recomenda que empresas, sindicatos e órgãos públicos estabeleçam diretrizes e adotem condutas a fim de garantir a proteção dos trabalhadores.

Vários foram os pontos abordados pelo Ministério Público do Trabalho, dentre os quais vale citar: (i) observância da jornada contratual na adequação das atividades na modalidade de teletrabalho e em plataformas virtuais; (ii) compatibilização das necessidades empresariais e dos trabalhadores e suas responsabilidades familiares; (iii) ajuste via aditivo ao contrato prevendo a duração do trabalho prestado de forma remota; (iv) adoção de escalas de trabalho que acomodem as necessidades da vida familiar.

A Nota Técnica 17 ainda recomenda (i) a adoção de ética digital no relacionamento com os trabalhadores e trabalhadoras, preservando seu espaço de autonomia para realização de escolhas quanto à sua intimidade, privacidade e segurança pessoal e familiar, bem como em relação à obtenção, armazenamento e compartilhamento de dados fornecidos pelos empregados e empregadas, sem prejuízo, neste último caso, das exigências legais aplicáveis; (ii) garantia de que o uso de imagem e voz seja precedido de consentimento expresso dos trabalhadores, principalmente quando se trata de produção de atividades a ser difundido em plataformas digitais abertas em que sejam utilizados dados pessoais (imagem, voz, nome) ou material produzido pelo profissional.

Outro ponto que merece atenção é o que recomenda a adoção de modelos de etiqueta digital, em que se oriente toda a equipe, com especificação de horários para atendimento virtual da demanda, assegurando os repousos legais e o direito à desconexão, bem como medidas que evitem a intimidação sistemática (Bullying) no ambiente de trabalho, seja verbal, moral, sexual, social, psicológico, físico, material ou virtual, que podem se caracterizar por insultos pessoais, comentários sistemáticos e apelidos pejorativos, ameaças por quaisquer meios, expressões preconceituosas, pilhérias, memes.

A Nota Técnica reforça o aspecto de garantia do respeito ao direito de imagem e à privacidade dos trabalhadores, seja por meio da orientação da realização do serviço de forma menos invasiva a esses direitos fundamentais, oferecendo a realização da prestação de serviços preferencialmente por meio de plataformas informáticas privadas, avatares, imagens padronizadas ou por modelos de transmissão online. Também incluiu em seu rol recomendações sobre o trabalho home office do idoso e da pessoa com deficiência.

O home office, ainda que em algumas empresas tenha sido implantado de modo improvisado, tem dado certo, mas carece de regulação apropriada, na medida em que o contrato de emprego por meio de teletrabalho (previsto na CLT) não equivale a prática de home office e vice-versa.

A pandemia do novo coronavírus impôs a necessidade de quebrar paradigmas para que fosse possível a continuidade das relações de trabalho. A rápida reconfiguração do mundo e da vida popularizou o trabalho remoto e impôs desafios, exigindo rápida adaptação e maleabilidade de todos os agentes.

A prática do home office estava associada ao equilíbrio entre vida pessoal e trabalho, mas a pandemia desmistificou esse conceito. Muitas horas de conexão e falta de estrutura adequada para o trabalho foram algumas das desvantagens identificadas pelos trabalhadores. Em que pese o aumento da produtividade, redução de despesas e a possibilidade dos empregadores instituírem o trabalho em home office como política de empresa, muitos empresários também identificaram desvantagens no modelo, pois entendem que a presença do trabalhador nos escritórios é importante como elemento de integração, coesão de valores e fortalecimento do espírito de equipe.

Mais uma vez “equilíbrio“ é a palavra de ordem. O trabalho em home office é uma realidade, logo, importante uma regulação clara, flexível e alinhada com as mudanças do mercado de trabalho.

Fonte: https://politica.estadao.com.br/blogs/fausto-macedo/home-office-e-necessaria-regulacao/